Comentário ao Acórdão nº0807/21.5BESNT- Marta Leitão
Data: 4 de julho de 2024
Processo nº0807/21.5BESNT
Marta Leitão, subturma 12, turma B, 2ºano
Resumo do Acórdão em questão:
AA, o recorrido, que não tinha um patrono, intentou uma ação contra a Ordem dos Advogados (OA), o recorrente, pelo Tribunal Administrativo Fiscal (TAF) com o objetivo de esta entidade permitir que este sujeito se pudesse inscrever no Curso de Estágio no Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados do ano de 2021 sem a apresentação de uma declaração de patrono e ainda que lhe fosse atribuído um.
Depois de um despacho a 8/02/2021 que antecipou a decisão do mérito da causa, o TAF julgou a ação precedente, o que fez com a OA apelasse ao Tribunal Administrativo Central-Sul (TAC-Sul) que, por sua vez, concordou com a decisão anteriormente proferida.
Posto isto, a OA pede uma admissão de recurso revista ao Supremo Tribunal Administrativo (STA), com base no artigo 150º nº1 do CPTA, referindo que é um recurso excepcional admissível nos termos deste mesmo artigo, que acaba por ser julgado procedente por unanimidade.
O TAF e o TCA-Sul baseiam a sua decisão na convicção que as normas do artigo 192º nº3 e nº4 do EOA, possibilitam implicitamente a habilitação legal para se proceder à nomeação de patrono a candidatos que ainda não disponham de uma aceitação pelo patrono para a inscrição no estágio (como mencionado no disposto do artigo 189º nº2 do EOA), uma vez que, apesar da letra da lei não referir especificamente a situação em causa, não há razões para distinguir os candidatos que têm dificuldade em encontrar um patrono, os candidatos que tiveram a sorte de conseguir um patrono e ainda aqueles que, nem no momento de inscrição, conseguiram arranjar um patrono. Tendo ciente que cabe à OA regulamentar o acesso ao exercício da profissão pelo disposto no artigo 3º nº1 al. c) da EOA, estes não podem impedir o direito fundamental de acesso à profissão sob pena de violarem o disposto no artigo 47º nº1 da CRP e constituírem uma inconstitucionalidade material.
Contrariamente, a posição da OA para requererem a revista fundam-se no facto das questões a serem apreciadas terem uma importante relevância jurídica e social, dada a sua complexidade, a falta de jurisprudência anterior e o potencial impacto em casos futuros, argumentando ainda que o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento face à interpretação do artigo 192º nº3 e nº4 do EOA e evidencia a violação da liberdade de escolha do advogado que vai contra o disposto nos artigos 47º nº1 e 18º da Constituição Portuguesa.
Enquadramento do conteúdo do Acórdão no Direito Administrativo:
De acordo com a doutrina dos professores J.M. Sérvulo Correia e Francisco Paes Marques "o Direito Administrativo pode definir-se como o ramo do Direito Público constituído pelo sistema de normas jurídicas que, em termos específicos, regulam a organização e o processo próprio de agir da Administração Pública, disciplinam as situações e as relações procedimentais, substantivas e processuais daquela com os particulares e asseguram a responsabilidade democrática da Administração." mencionando ainda que "o Direito Administrativo visa o interesse público e serve-se de poderes de autoridade para a consecução desse desiderato.". Por outro lado, a Ordem dos Advogados define-se como "uma associação pública, representativa dos profissionais que exercem Advocacia, regida pelo direito público." sendo que, "No exercício dos seus poderes, desempenha as suas funções de forma independente dos órgãos do Estado, sendo livre e autónoma da sua atividade."
Com isto, é possível concluir que a Ordem dos Advogados, enquanto entidade pública com funções regulatórias e disciplinares, se insere no Direito Administrativo, enquanto ramo do Direito Público que regula a Administração pública e, consequentemente, as entidades públicas.
Comentário face ao Acórdão:
Com base nas argumentações feitas por ambas as partes, acredito que a decisão do Supremo Tribunal Administrativo tenha sido a mais indicada.
Apesar dos dois Tribunais Administrativos já terem proferido a sua sentença, a matéria em questão é de elevada importância e remete ainda para questões de inconstitucionalidade que devem ser discutidas com grande precaução e pelas entidades mais competentes para tal.
Em relação ao problema em si, defendo a posição tomada pela Ordem dos Advogados, uma vez que, o TAF e do TAC-Sul baseiam a sua sentença numa interpretação extensiva, ou seja, que vai além da letra da lei, o que é compreensível que gere uma elevada discórdia em situações futuras quanto a este assunto, o que não é desejável.
Bibliografia:
CORREIA, J.M. Sérvulo/MARQUES, Francisco Paes, Noções de Direito Administrativo, Volume I, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2021
Webgrafia:
https://portal.oa.pt/cidadaos/o-que-e-a-ordem/
Acórdão: