Comentário ao Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 20/06/2024, n.º do processo: 131/20.0BELLE - Sara Faísca
O presente acordão aborda a questão da intempestividade da prática do ato processual e a distinção entre nulidade e anulabilidade de um ato administrativo.
O requerente no caso interpôs uma decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, onde contestava a redução da pensão de sobrevivência atribuída à sua falecida esposa, invocando que o ato da Caixa Geral de Aposentações era nulo, fundamenta a sua posição com o argumento da falta da audiência prévia (art. 121º do CPA) e a falta de fundamentação (art. 152º do CPA), conclui que como havia estes vícios a impugnação podia ser realizada a qualquer tempo.
A decisão do Tribunal na sua primeira instância foi absolver a Caixa Geral de Aposentações, dado que considerou que o requerente impugnou o ato administrativo fora do prazo, tendo em conta que o prazo fixado por lei é somente de três meses. Os argumentos do requerente no recurso são de que o ato administrativo não é meramente anulável mas sim nulo e por isso não estava sujeito ao prazo de três meses mas que podia impugnar a qualquer momento uma vez que os vícios de falta de audiência e ausência de fundamentação eram suficiente para classificar o ato como nulo, não só porque são direitos previsto no CPA como são considerados direitos fundamentais previstos pela Constituição da República Portuguesa e por isso o ato deveria ser considerado como inexistente no panorama jurídico.
O Tribunal realçou a importância de distinguir a nulidade e a anulabilidade isto porque nulidade implica sim uma inexistência do ato mas a anulabilidade implica que o ato ainda pode vir a ser corrigido e que por isso são fixados prazos legais, a justificação do Tribunal para a não utilização dos argumentos do requerente no recurso foi de que eles não foram utilizados de forma adequada e que os vícios deviam ter sido assinados logo no momento inicial do processo em vista disso o Tribunal conclui absolvendo a Caixa Geral de Aposentações mais uma vez.
Analisando a base jurídica de formas mais precisas, conseguimos identificar os fundamentos utilizados pelo requerente, em primeiro lugar o fundamento da nulidade dos atos administrativos, presente no artigo 161º do CPA, onde podemos retirar como alíneas base para o acórdão as alíneas d) e l) do n.º 2, considerando que a alínea d) refere o seguinte: "Os atos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental;" e como é conformado pelo artigo 268º da CRP, a alínea l) "Os atos praticados, salvo em estado de necessidade, com preterição total do procedimento legalmente exigido.", estes artigos são sustentados pela característica de atos nulos pelo n.º 1 do mesmo artigo: "São nulos os atos para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade.". A impugnação dos atos nulos encontra-se consagrada no artigo 162º do CPA, onde refere que "Salvo disposição legal em contrário, a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado".
Em oposição a anulabilidade dos atos administrativos já estão sujeitos a prazo legal como indica o artigo 163º n.º 4 CPA o seu n.º 1 menciona que "São anuláveis os atos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou outras normas jurídicas aplicáveis, para cuja violação se não preveja outra sanção."
No que diz respeito ao direito de audiência prévia do artigo 121º do CPA, a violação deste direito pode levar a um vício procedimental e configurada como nulidade pelo artigo 161º n.º 2, alínea l), não obstante da jurisprudência classificar em alguns casos como anulabilidade, contudo o que o artigo dispõe é o seguinte "os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta".
Para finalizar a análise, vejamos o dever de fundamentação estipulado pelo artigo 152º do CPA, nos termos do n.º 1, alínea a): "Neguem, extingam, restrinjam ou afetem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos, ónus, sujeições ou sanções;", o tribunal assumiu pelas alegações terem sido apenas feitas em sede de recurso não podiam ser consideradas em apreciação da intempestividade.
Em suma, o tribunal segue a posição de que se deve afastar a intempestividade quando a nulidade não é referida na petição inicial, mantendo assim a sua posição na primeira instância.
Bibliografia:
FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Volume II,4ª Edição, Almedina. Coimbra, 2018.
Sara Faísca, N.º 69550, Turma B, Sub-Turma 12