Comentário ao Acórdão do STA, Processo n.º 0906/23.9BELRA de 07/05/2025- Armanda Andrade

19-05-2025

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado a 7 de maio de 2025, processo n.º 0906/23.9BELRA, relatado por Teresa de Sousa.


O acórdão em análise aborda a questão da responsabilidade civil extracontratual do Estado por atrasos na administração da justiça, mais concretamente em processos de insolvência.

Esta questão surge da dúvida sobre se quem deve ser responsabilizado por uma morosidade processual ocorrida no âmbito de um processo de insolvência, se o Estado, enquanto garante da função jurisdicional, ou o administrador de insolvência, figura autónoma cuja responsabilidade está regulada pelo artigo 59.º do CIRE.


O processo teve origem numa ação intentada por AA contra o Estado, pedindo indemnização por danos não patrimoniais devido à demora no seu processo de insolvência. Inicialmente o TAF de Leiria julgou a ação improcedente, atribuindo a responsabilidade exclusiva ao administrador de insolvência, absolvendo o Estado de qualquer responsabilidade

No entanto, o TCA Sul entendeu de forma diferente, defendendo que, mesmo nos períodos em que o administrador atua, a responsabilidade pela morosidade global do processo recai sobre o Estado. Por isso, revogou a sentença anterior e condenou o Estado a pagar uma indemnização.


O ponto central deste acórdão é a distinção entre a responsabilidade pessoal do administrador judicial (prevista no artigo 59.º do CIRE) e a responsabilidade pública do Estado pelo funcionamento eficaz do sistema judicial, nos termos da Lei n.º 67/2007. Reconhece-se que, embora o administrador atue com alguma autonomia, a sua intervenção decorre num processo sujeito à supervisão do tribunal. Assim, mesmo que haja falhas imputáveis a este auxiliar da justiça, o Estado mantém o dever de garantir uma tramitação célere e eficaz.


Esta abordagem insere-se numa reflexão mais ampla sobre os princípios fundamentais do Direito Administrativo, pilares estruturantes da atuação da Administração Pública.

Em primeiro lugar, destaca-se o princípio da boa administração, previsto no artigo. 5.º do CPA e também no artigo 41.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que exige que a atividade administrativa deve ser apta a atingir os objetivos que lhe cabe prosseguir e de maneira a durar apenas o estreitamento necessário para que possa atingir os fins que lhe competem.

A morosidade excessiva nos processos judiciais viola claramente este princípio, uma vez que compromete a confiança legítima dos administrados e impede a concretização atempada dos seus direitos.

Outro princípio é o da tutela jurisdicional efetiva, previsto por exemplo no artigo 20.º da CRP que consagra que a justiça deva ser feita atempadamente, de maneira célere e prioritária, evitando demoras que possam prejudicar os direitos e interesses dos cidadãos. Garante também que todos os cidadãos têm direito a obter uma decisão judicial em prazo razoável. A violação deste princípio demonstra uma falha do sistema de justiça enquanto serviço público.


Neste contexto, o STA decidiu admitir a revista por considerar que a matéria em discussão tem uma relevância jurídica e social significativa e justifica a sua apreciação para clarificar a jurisprudência. A decisão mostra o papel essencial dos tribunais administrativos no controlo da legalidade da atuação estatal e na proteção dos direitos dos cidadãos, sobretudo quando em causa está o funcionamento de um serviço público e fundamental como é a justiça.


BIBLIOGRAFIA

Diogo Freitas do Amaral, «Curso de Direito Administrativo», volume II

Vasco Pereira da Silva, Aulas Teóricas


Armanda Andrade, n.º69889


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