Comentário ao Acórdão 02630/23.3BELSB do STA - Diogo Ventura

01-12-2024

O caso refere-se ao recurso interposto pelo Instituto dos Registos e Notariado (IRN), após decisão de instância inferior que ordenou a tramitação urgente de um pedido de nacionalidade portuguesa, ao abrigo do artigo 1.º, n.º 1, alínea d), da Lei da Nacionalidade. O requerente, neto de português, fundamentou o pedido na sua condição de saúde (doença oncológica), pedindo uma decisão prioritária.

A questão centra-se na adequação do processo de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, regulado nos artigos 109.º a 111.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), para compelir a Administração a decidir rapidamente o pedido de nacionalidade. O IRN argumenta que o requerente possui apenas uma expectativa de direito e que o meio processual é inadequado.

O Supremo Tribunal Administrativo (STA) entendeu que o direito à nacionalidade, previsto no artigo 26.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP), é um direito fundamental que, segundo o artigo 17.º da CRP, merece a proteção atribuída aos direitos, liberdades e garantias. Neste contexto, a intimação constitui um meio processual apropriado, uma vez que o artigo 20.º, n.º 5 da CRP garante uma tutela judicial célere e prioritária para proteger direitos fundamentais em risco de lesão. Além disso, o tribunal destacou a urgência do caso devido à condição de saúde do requerente, considerando justificada a necessidade de proteção urgente.

O artigo 59.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) e o artigo 41.º do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (RNP) obrigam a Administração a decidir dentro de prazos estipulados. O tribunal rejeitou a alegação do IRN sobre falta de recursos, afirmando que a falta de meios não justifica a inércia em matérias que envolvem direitos fundamentais. O dever de decisão é um princípio procedimental essencial, especialmente em processos que afetam diretamente a vida e os direitos dos cidadãos.

O tribunal argumentou que a ordem judicial não viola a separação de poderes (artigo 111.º da CRP), pois não impôs um conteúdo à decisão, mas apenas obrigou a Administração a cumprir o seu dever de decisão. A autonomia administrativa para estabelecer critérios de tramitação não pode justificar a omissão de uma decisão, sobretudo quando estão em causa direitos fundamentais, como reforçado pelos artigos 12.º, 13.º e 15.º da CRP e pelo artigo 13.º do CPA.

O STA confirmou a decisão de tramitação prioritária do pedido de nacionalidade, reforçando o princípio de celeridade administrativa e sublinhando a importância de tutela judicial em casos de saúde grave. Este acórdão destaca o dever da Administração de priorizar casos urgentes e protege o direito fundamental à nacionalidade, oferecendo uma orientação relevante para futuras situações de inércia administrativa.


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